Da janela do meu quarto,
por entre grades, vejo o Colibri ferido. O pobre pássaro tinha uma das asas
quebrada. Asa quebrada, liberdade tolhida. Era uma cena deveras triste, fitar o
pequeno pássaro – senhor dos ares – preso ao chão, quando seu destino e sua
natureza chamavam-no às alturas. Seu canto parecia um lamento que transpassava
o meu ser e contorcia-me as “entranhas”. Aos poucos, aquele canto ou gemido foi
dando lugar ao silêncio. Silêncio que parecia resignação. Não havia mais canto,
a dor tem, às vezes, um teor ascético: “abstém-te e suporta”. Mas, fazer ascese
é sempre morrer um pouco.
Olhando o Colibri, vi
apenas o quanto ele era prisioneiro. Se pudesse raciocinar, agora saberia avaliar
a riqueza dos momentos nos quais rasgara o vento e sentia as asas da liberdade.
Tempos que podia alçar voos ao encontro do néctar da mais nobre Açucena. A flor
rubra como o sangue e singela com um anjo.
Pobre Colibri, envolto
no manto do silêncio resignado. Se pudesse amar, ficaria triste ao sentir que
não ouviria mais o sussurro da Açucena bailando diante dos seus olhos, embalada
pelo vento de suas asas. Imaginar aquele som como uma música aos seus ouvidos e
aquela cena como um espetáculo aos seus pequenos olhos.
A vida deste Colibri,
ferido e aprisionado ao solo como uma árvore pela raiz, agora está por um fio. A
ave pequena nascida para as alturas parece saber que sua vida é, em grande
parte, dom da Açucena, quando esta lhe oferecia a seiva da vida. Se a nobre
flor fosse uma mulher, creio que a seiva não se chamaria néctar, mas amor. E seria
o amor de Açucena o único laço admissível a anelar o senhor dos ares.
Pode-se privar o
Colibri de voar, como se pode privar o ser humano de amar. Porém, nos dois
casos será sempre uma sentença de morte.
Epitácio
Rodrigues
In: DUARTE, Elieldo Carvalho
& RODRIGUES, Epitácio. As Portas do Tempo nos Muros da Vida.
Crato: BSG, 2013, pp. 31-32.
Simplesmente amei ❤💕💖
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