Hoje,
28 de janeiro, acordei mais cedo. Queria admirar minha amada enquanto ela ainda
dormia. Os primeiros raios de sol começam a invadir a nossa casa avisando que o
dia já está amanhecendo. Enquanto ela dorme, observo seu rosto delicado, ainda a
exibir aquela beleza que primeiro me fascinou, num outro 28 de janeiro, anos
atrás. Sempre me pareceu intrigante tê-la conhecido exatamente no dia do seu
aniversário, num encontro que tinha tudo para ser causal e, no entanto, há
quase uma década acordo, todos os dias, ao seu lado.
Naquele
dia eu era apenas um homem procurando a chave de uma porta. Não sabia que era o
seu aniversário, na verdade eu, recém chegado àquelas terras, não fazia ideia de
que ela existisse. Procurando uma chave, sem o saber, bati à porta de uma nova
história que nem imaginava que seria desenhada no futuro. Vê-la vindo em minha
direção, causou-me um agradável desconforto. Eu até poderia dizer que foi amor
à primeira vista, mas não foi, pois não se pode amar quem não se conhece. O que
senti foi fascínio: fiquei fascinado com a sua presença. Com o tempo, a
convivência fez do fascínio amizade; a amizade transformou-se em cuidado; o
cuidado virou amor; o amor virou projeto e propósito de envelhecer ao seu lado.
Quanto tempo, em meus solillóquios,
relutei contra esse sentimento: calado, sigiloso, tentando enganar-me de sua
existência: era mais cômodo fingir que não existisse.
A
força avassaladora do amor é como uma enchente incontrolável, sempre segue seu
rumo e impõe o respeito do seu espaço. Parei de lutar contra mim mesmo. Aceitei
parar de lutar contra a correnteza. Uma decisão que provocou incompreensão,
afastamentos, preconceitos e reprovação. Quando se ama, não se fica preso ao
consenso público. Os anos que se seguiram foram particularmente difíceis.
Hoje,
acho muito divertido observá-la mudando de configuração em cada situação: às
vezes, uma menina travessa, quando brinca com as nossas crianças; às vezes, uma
adulta comprometida, responsável, quando está preocupada com o bem-estar e a
melhor vida que podemos dar a eles; às vezes uma esposa, mulher e cúmplice no
amor...
Hoje,
28 de janeiro, sei que o meu amor não é mais o mesmo dos primeiros anos.
Sinto-o mais real, mais concreto, menos idealizado, mais cúmplice, mais sereno.
Mais uma vez, no seu aniversário, enquanto ela dorme serenamente, agradeço aos
céus pela sua existência, pois ela faz das nossas vidas, minha e dos nossos
filhos, um grande presente.
Epitácio Rodrigues da Silva
prof_epitacio@hotmail.com
Crônica publicada na Revista da Cultura. Link: http://www.revistadacultura.com.br/resultado/15-05-04/Aquele_28_de_Janeiro.aspx
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