Caro
editor,
Não
escrevo esta crônica somente em causa própria, mas em nome de todos os
cronistas, os bons e também os ruins, e o faço pensando, sobretudo, no futuro
deste gênero textual. A minha reivindicação, melhor, meu apelo - já que não
posso forçá-lo a fazer o que almejo - é modesto, mas muito pertinente, pois,
como disse, do desfecho depende o futuro das crônicas. O que quero afinal?
Simplesmente que reserve um espaço no jornal para as crônicas. Imagino que o
senhor a considere um elemento desnecessário, pois o espírito pragmático do
homem contemporâneo não se coaduna a um texto jornalístico que não seja
notícia, reportagem ou, no máximo, um artigo de opinião. Por isso, vou ensaiar
alguns argumentos, se não na esperança de convencê-lo, ao menos de
sensibilizá-lo para nossa causa.
Primeiro,
no universo da literatura, a crônica é o que tem de mais prático: é um texto
curto, construído com uma linguagem coloquial; às vezes, com uma pitada de
humor, de crítica e ou de sentimentos, os mais românticos ou humanitários, tudo
isso sob uma roupagem literária (entenda-se: redigido com uma estética que
agrada a quem a lê). Para o leitor que ficou angustiado depois de ler as
notícias de desastres, de corrupção e violência, a crônica pode enlevar o
espírito e talvez desintoxicá-lo de tanta informação negativa.
Segundo,
existe uma responsabilidade social dos escritores, como bem lembrou Viktor
Frankl, “o menor serviço que o escritor pode prestar ao leitor deveria ser o
despertar do senso de solidariedade”
(Um sentido para a vida, 1989, p.83).
Ademais,
senhor editor, é muito provável que não sejam as notícias que façam o brilho do
jornal, já que todos os jornais noticiam praticamente os mesmos fatos. O
diferencial, neste caso, pode estar no singular, no não convencional desse
veiculo de informação. Creio não ser necessário lembrar que foram esses
pequenos espaços que fizeram Rubem Braga; que ajudaram a consagrar Machado de
Assis, José de Alencar e tantos escritores que enchem de orgulho a todos nós
brasileiros. Mas também são os nomes desses jornais que abriram um espaço
discreto a esses cronistas, que, mesmo após a sua última crônica, continuam perpetuados
nas biografias desses pretensos eternizadores do efêmero.
Talvez o
senhor até se sinta sensibilizado com o meu apelo, mas considere que a
manutenção de um jornal é muita cara e que os espaços devem ser adequadamente
aproveitados. Nisso estamos de acordo. Mas (tem sempre um “mas”), penso, na
minha incontida ignorância, que com as versões on line, mais visitadas e mais lidas, não haveria um aumento de
custos e assim estaria garantido também o seu compromisso com os leitores de
mantê-los informados. É provável que o senhor contra-argumente, lembrando-me de
que existem inúmeros espaços e possibilidades, dentre as quais os blogs
pessoais, onde cada escritor pode escrever e postar suas crônicas. Concordo
com o senhor, mais uma vez! Há, de fato, essas possibilidades, mas a literatura
tem seus rituais, e os leitores fazem questão de conservá-los. Uma crônica
publicada num blog é ainda uma crônica, mas se não traz a indicação que foi
publicada originariamente num jornal, será sempre considerada “uma literatura
menor”, sem credenciais e abalizamentos de um editor. Isso porque, caro editor,
no Brasil, as crônicas são filhas adotadas pelos jornais, por isso, eles devem
reservar um espaço para elas. São nos jornais e revistas que elas,
primeiramente, sentem-se em casa e é lá que elas recebem as primeiras visitas
do leitor.
Se após
todas essas considerações, julgar que não é oportuno reservar um espaço para as
crônicas no seu jornal, peço que apenas publique esta como apoio ao nosso
manifesto ou apelo.
Atenciosamente,
Um
cronista.
Epitácio
Rodrigues
(Crônica
publicada na Revista da Cultura. Link: < http://www.revistadacultura.com.br/resultado/15-03-03/MANIFESTO_DE_UM_CRONISTA.aspx
>. Publicada também no Jornal O Povo on line. Link: http://www.opovo.com.br/app/jornaldoleitor/noticiassecundarias/cronicas/2015/03/09/noticiajornaldoleitorcronicas,3404298/o-manifesto-do-cronista.shtml )
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